01 julho 2022




Museu da Loucura: Hospital Colônia de Barbacena


      Hoje para concluir o meu último post sobre a minha viagem a Barbacena, vou falar sobre a minha ida ao Museu da Loucura, o antigo Hospital Colônia de Barbacena. Tentei relatar o pouco que sei sobre o que foi denominado "Holocausto Brasileiro", acompanhado das fotos e montagens que eu fiz, além dos registros do próprio museu. 



      O início desse hospital, antes de se tornar psiquiátrico, era um local feito para pessoas das mais altas classes sociais se internarem, afim de tratar doenças da época, como a turberculose. Tamanho era o luxo, os pacientes hospedados comiam em louças de porcelana. 

      Somente em 1903, em decorrência de uma necessidade de um hospital manicomial no Brasil, o hospital se tornara um antro para abrigamento aos rejeitados. Inicialmente até houvera uma tentativa de tratamentos dos pacientes com uma medicina que hoje é considerada arcaica, mas que eram na verdade os conhecimentos obtidos na época. 




       Eram internados quaisquer pessoas indesejadas pela sociedade naquela época, com objetivo de eliminá-las de perto: em sua maioria negros que ainda não eram bem-vindos na sociedade racista que vinha há poucas décadas do fim do regime de escravidão;  mulheres que perdiam a virgindade/engravidavam antes do casamento, que desobedeciam pais ou marido; pessoas introspectivas, deprimidas, com problemas de sociabilização; pessoas sem documentos ou desconhecidas pela cidade; portadores de doenças psiquiátricas; homossexuais; portadores de necessidades especiais e deficientes físicos; qualquer pessoa que a família ou alguém importante desejasse internar por desafeto, incluindo crianças. 

      Em Barbacena até hoje se passa um trem, porém atualmente é apenas para transporte de cargas. Naquela época, pacientes (se é que podem ser chamados disso) eram recolhidos por todo o estado e abandonados no hospital, transportados em dezenas no que era chamado de "trens de doidos". Mesmo com um crescente aumento da estrutura física, era totalmente ineficiente para abrigar a população de rejeitados que crescia cada vez mais ao passar dos meses. 


O trem



"Joaquim Antônio Dutra (1953-1943) 


O Fundador


Nasceu em São João Nepomuceno (MG), no dia 21 de agosto de 1853 e formou-se pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro (1881). Em Leopoldina (MG) iniciou sua carreira política elegendo-se presidente da Câmara Municipal, depois deputado da Assembleia Provincial e senador estadual. Estudioso dos transtornos mentais, foi mebro de sociedades acadêmicas de psiquiatria na Bélgica, Itália, Inglaterra e Estados Unidos da América. Em 1903, assumiu a criação e direção da Assistência a Alienados de Minas Gerais e Hospital Colônia de Barbacena; Ocupou a direção do hospital por 33 anos"



      Assim que chegavam ao hospital, pacientes eram despidos de qualquer individualidade que possuíam. Todos os pertences eram recolhidos, homens e mulheres eram desumanizados,  obrigados a raspar a cabeça e tomar banhos gelados coletivos. Após isso, usavam o famoso uniforme Azulão, feito com tecidos de não tão boa qualidade, mas que nem sequer todos os pacientes recebiam. Aos que não recebiam o uniforme, eram obrigados a andar nús pelos pátios do hospital, desprovidos de qualquer proteção contra o frio de Barbacena, que em épocas invernais é bem rigoroso. 



 


      Nas fotos acima é perceptível as pessoas com uniformes, outras sem roupas e a população em sua maioria sendo negra. 

      Abaixo uma foto de uma das panelas usadas no hospital. Muitas vezes era apenas uma única refeição diária, feita com ingredientes de péssima qualidade, as vezes até estragados, fruto de um desvio de verba que ocorria pelos administradores do hospital. Formavam se filas extensas no pátio e muitas vezes por extrema fome, os internos se alimentavam de qualquer coisa que se era encontrado no ambiente, incluindo ratos. 




"Eletroconvulsoterapia


Desenvolvido na década de 1930, por psiquiatras italianos, o método de provocar convulsões através de descargas elétricas, o eletrochoque, passou a ser usado largamente em especial nos casos depressivos. Somente nos anos de 1960, o ECT começou a ser usado após anestesia do paciente. 

Os riscos: luxações, fraturas e eventualmente, morte por parada cardíaca e respiratória. As descargas variam entre 120 e 130 volts."




"A psicofarmacologia passou a prevalecer com o desenvolvimento de medicamentos cada vez mais eficazes. Nos primórdios do Hospital Colonia, sua farmácia manipulava alguns deles."



     A lobotomia era um dos "tratamentos" que na época eram oferecidos aos internos. Muitas vezes sem anestesia, a técnica consistia em acessar ao cérebro da pessoa, batendo com um orbitoclast, instrumento similar ao picador de gelo. Era um verdadeiro show de horrores, com sequelas e danos irreversíveis, ocasionando muitas vezes a morte. Na parte superior da imagem acima, fotografei algumas ferramentas utilizadas no hospital na época.



       A crescente demanda de internos eram diária. Em 1959 começou a ser implantado o leito único, para suprir a falta de espaço que ocorria devido a superlotação de pacientes, ou se posso dizer, rejeitados pela sociedade. Consistia em retirar as camas e fazer todos os pacientes dormir no chão, por cima apenas de capins, lotados de insetos, ratos e dejetos. Para conter o frio, as pessoas se amontoavam uma por cima da outra, criando uma espécie de aquecimento humano. Por noite, era comum que muitas pessoas não resistissem devido ao sufocamento do peso do amontoado, ao frio rigoroso e as diversas condições inumanas que eram submetidas naquele que um dia era para ser um hospital psiquiátrico, mas que se tornara um grande centro de tortura no Brasil.


      Como as mortes eram diárias devido a todas as formas insalubres de vida, os administradores acharam uma forma de lucrar com a venda desses corpos para faculdades de medicina. Registros apontam que começaram em 1960 e o auge foi 1971. E como era dito ali na imagem anterior, em 103 meses os registros apontavam a venda de mais de 1853 corpos. 


"Cadernos de registro originais de pacientes cujos corpos foram vendidos para faculdades de medicina de Minas Gerais e Rio de Janeiro

Cédulas e moedas de várias épocas, confiscadas dos pacientes

Alianças de ouro recolhidas durante a internação no hospital colônia

Calculadora mecânica utilizada no setor administrativos do Hospital Colônia"



      Aqui são vários jornais de uma série que foi escrita pelo jornal Estado de Minas expondo toda a situação do hospício de Barbacena. Após diversas denuncias de torturas, insalubridade, comércio ilegal de corpos, entre outras coisas, finalmente o Brasil pode ver o que acontecia dentro do Hospital Colônia de Barbacena. Graças a luta antimanicomial no Brasil que começou em 1970, diversas leis foram criadas no decorrer do tempo para que o que aconteceu em Barbacena não acontecesse novamente jamais. 


Reforma psiquiátrica


       O hospital foi desativado em 1993, algo que de certa forma ainda é recente. Muitos pacientes são vivos até os dias de hoje. Aos quais passaram por longas internações e possuem transtornos mentais, moram atualmente em residências terapêuticas destinadas a tratamentos psiquiátricos, hoje feito pelo SUS e acompanhado pelo estado. Hoje Barbacena abriga 24 residências terapêuticas em seu total. 


Maquete do hospital

Arquitetura

A última cela desativada


Livro de registros destinados a visitantes 

Passaporte real: para quem possui,  o hospital é um local que concede o visto

        Hoje ao lado do museu, fica o hospital regional de pronto atendimento de Barbacena


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       Espero que tenham gostado dessa visitação que eu fiz, um post que saiu totalmente do contexto daqui do blog. Eu gostei muito dos conhecimentos que obtive nessa visitação, foi algo necessário para que nunca mais se repita novamente. O que vocês acharam? Comentem. 

Beijos,


4 comentários:

  1. Que horror! Confesso que li até a metade porque achei super pesado, incrível pensar como era a sociedade na época, que fazia isso com as pessoas, ainda bem que mudou!

    Bom findi!
    tipsnconfessions.blogspot.com

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  2. Nossa que triste, sério... esses assuntos realmente me deixam triste de verdade, mas ao mesmo tempo é algo muitoo interessante e que precisa ser falado.
    Eu não conhecia a história desse hospital e fiquei chocada e mais chocada ainda que foi desativado não faz tantoo tempo assim.
    Dois filmes que recomento muito sobre o assunto são Nise: O Coração da Loucura e Bicho de Sete Cabeças.

    https://www.heyimwiththeband.com.br/

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    Respostas
    1. Sim, infelizmente é bem triste :(. Eu também fiquei chocada que demoraram com a desativação de vez...
      Eu queria ver esse Bicho de Sete Cabeças há um bom tempo, mas acabei nunca assistindo. Vou anotar e procurar para assistir, sem dúvidas ♥

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